Entidade investigada por descontos indevidos recebeu patrocínio para a realização de evento que contou com a presença de Lula
A Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), uma das entidades investigadas por descontos indevidos em benefícios do INSS, recebeu ao menos R$ 1,85 milhão em patrocínios da Caixa Econômica Federal, do Sesi e do Sebrae para a realização de dois eventos em 2023 e 2024, diz a Folha. Um desses eventos contou com a presença do presidente Lula.
Marcha das Margaridas, realizada em agosto de 2023 em Brasília, teve R$ 1 milhão repassado pelo Sesi, R$ 350 mil pelo Sebrae e outros R$ 350 mil pela Caixa.
O evento foi encerrado com um discurso de Lula e funcionou como ato político em defesa da pauta de reivindicações da Contag.
O outro evento financiado foi a 3ª Mostra Nacional de Produção das Margaridas, exposição de produtos agroecológicos e artesanais de mulheres do campo, realizada em agosto de 2024.
Sem a presença de Lula, o evento recebeu R$ 150 mil da Caixa.
Os valores foram identificados pelo jornal paulistano em levantamentos nos sites dos patrocinadores.
Além desses dois eventos, entidades estaduais ligadas à Contag também receberam ao menos R$ 117 mil de estatais nos últimos dois anos.
O Antagonista lembra ainda que Lula recebeu a diretoria da Contag em 3 de abril de 2024, incluindo a então secretária de Política Agrícola, Vânia Marques Pinto, e o então presidente da entidade, Aristides Veras dos Santos, irmão do deputado federal Carlos Veras (PT-PE).
Na ocasião, Lula disse:
“É importante que a maioria da pauta entregue por vocês seja contemplada pelo governo. Vamos fazer o possível para conseguir.”
Vânia Marques Pinto foi eleita presidente da Contag um ano depois, em 3 de abril de 2025.
O PT celebrou sua vitória no site do partido: “Contag elege primeira mulher para a presidência”.
O deputado federal petista Elvino Bohn Gass fez o mesmo, publicando foto dele com Vânia no Facebook: “Bohn Gass celebra: Contag elege uma mulher para a presidência”, dizia a postagem.
Investigação sobre a Contag
A Contag é a principal entidade envolvida no caso dos descontos indevidos de aposentados: detém o maior número de filiados com desconto em folha — 1,3 milhão de pessoas — e seu acordo com o INSS remonta à década de 1990.
Só em 2024, os descontos atribuídos à confederação somaram R$ 435 milhões.
Apesar disso, a entidade ficou de fora da ação judicial movida com base na Lei Anticorrupção.
Segundo o governo, foram incluídas apenas entidades com fortes indícios de serem “de fachada” ou de terem pago vantagens indevidas a agentes públicos.
A ação pediu o bloqueio de R$ 2,56 bilhões em bens, a quebra de sigilo fiscal e bancário, apreensão de passaportes e suspensão das atividades de 12 entidades e seus dirigentes.
Patrocinadores negam interferência
O Sesi afirmou que os recursos para a Marcha das Margaridas seguiram critérios técnicos e estavam alinhados aos objetivos da instituição.
O Sebrae, por sua vez, destacou que o evento inclui o público-alvo da entidade, composto por produtores da agricultura familiar.
Já a Caixa informou que seus patrocínios seguem o plano estratégico do banco e respeitam a Lei das Estatais.
Reportagem
A fraude no INSS foi revelada pelo repórter Luiz Vassalo, cujas reportagens geraram investigações de auditores concursados da Controladoria-Geral da União (CGU) e agentes da Polícia Federal (PF).
Os casos surgiram em 2019, sob o governo de Jair Bolsonaro, e aumentaram exponencialmente quatro anos depois, sob o governo Lula.
No total, 6 milhões de pessoas vinham sendo descontadas mensalmente em seu salário de aposentadoria, a maioria sem consentimento, comprometendo ao todo R$ 6,3 bilhões. Os descontos só foram alegadamente suspensos em abril de 2025.
O esquema levou ao afastamento de seis servidores, à demissão do então presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, e à saída do ministro da Previdência Social, Carlos Lupi (PDT), após reunião com Lula.
Fonte: O Antagonista